Águas Territoriais | Hidrografia
Chamam-se águas territoriais as do mar
territorial, faixa marítima junto ao litoral de um país, ou das partes
de rios e lagos que estão sujeitas à jurisdição de um estado. Variaram,
ao longo do tempo, os critérios e medidas utilizados para fixar o
conceito e disciplinar sua aplicação. De modo geral, o assunto permanece
polêmico, dependendo de discussão e entendimento entre os países
interessados. É que, ao contrário das águas nacionais, as territoriais
pressupõem, por si mesmas, a possibilidade de disputa, como as faixas
litorâneas dos oceanos, os lagos que se dividem entre dois ou mais
países (como o Titicaca, entre o Peru e a Bolívia) ou os rios que
percorrem duas ou mais unidades políticas.
A importância das águas territoriais para o direito decorre do fato de sempre envolverem interesses internacionais, pois quer essas águas sejam marítimas, quer sejam fluviais ou lacustres, seu significado econômico nunca se limita a um único país. Cumpre distinguir as águas territoriais das nacionais, como, no Brasil, o rio São Francisco ou a lagoa dos Patos.
Rios
No caso dos rios que constituem águas nacionais, isto é, que têm seu curso situado no território de um único estado o problema não se discute: o país em que se encontram exerce pleno domínio sobre eles. Muito diferente é a situação dos rios internacionais, de que existem dois casos, conforme seus trechos suscetíveis de navegação comercial separem ou atravessem os territórios de dois ou mais estados. No primeiro caso, se não houver limites fluviais estabelecidos, o rio será comum às populações ribeirinhas. Quanto aos limites, se forem necessários, devem ter a linha divisória bipartindo o leito do rio, seja à meia distância das margens, seja, como de hábito, passando pelo talvegue (canal mais profundo do leito de um curso d,água).
No segundo caso, pelo menos quatro soluções distintas foram apresentadas pelo direito internacional: a primeira, que durou até a revolução francesa, sustentava o inteiro domínio das populações ribeirinhas sobre os trechos de curso d'água sob sua soberania, pelo que podiam cobrar tributos de passagem e negociar em torno de outros entraves à navegação. A segunda, aplicada ao Mosela e ao Reno, abolia tais barreiras, estabelecendo um regime de livre navegação para os ribeirinhos. A terceira orientação baseou-se no Congresso de Viena (1815), que atribuiu às populações ribeirinhas o direito de regulamentar a navegação correspondente. A quarta solução para o problema iniciou-se com os tratados de paz concluídos após 1919, que internacionalizaram os rios europeus mais importantes, levando em 1921 à Convenção de Barcelona. Por essa convenção, a que o Brasil não aderiu, os cursos d'água foram considerados em função de sua utilidade econômica e consagrou-se, para navios de todas as bandeiras, a liberdade de navegação não militar nos rios internacionais, bem como o princípio de igualdade de tratamento para todos os usuários.
Atualmente, admite-se que, embora cada estado tenha controle soberano dos rios internacionais dentro de suas respectivas fronteiras, deve exercê-lo sem perder de vista os interesses das demais populações ribeirinhas. Nas Américas, prevaleceu a regulamentação convencional entre povos ribeirinhos, tornando-se freqüente a concessão unilateral da liberdade de navegação por parte deles, como fez o Brazil com o rio Amazonas e seus afluentes em 1866-1867. Além da navegação, pode haver nos rios internacionais a pesca e outros tipos de aproveitamento econômico que beneficie as populações ribeirinhas.
Mares e lagos internos
Quando completamente encravados em territórios continentais de um só estado, os mares e lagos internos lhe pertencem. Se, ao contrário, as terras circundantes forem de vários estados, essas águas lhes caberão por partes convencionadas. Se um mar ou lago interno se comunica com o mar livre por uma passagem navegável, e se toda a região circundante -- inclusive a passagem -- pertencer a um só estado, terá este exclusiva soberania sobre tais águas. Em idênticas condições, se a passagem for livre, também livre será o mar, acontecendo o mesmo se as costas ou passagens, forem de vários estados. No caso dos lagos, no entanto, as populações de suas margens, em princípio, têm exclusividade sobre qualquer exploração de benefício.
Estreitos
Passagens marítimas naturais e relativamente apertadas entre dois mares (pelo menos um deles livre), os estreitos, quando têm as respectivas entradas até duas vezes mais largas que o mar territorial, havendo apenas um estado costeiro, terão suas águas incluídas no mar territorial deste. Se houver dois estados costeiros, as respectivas águas territoriais terão seus limites na linha mediana do estreito. Nos casos em que esse último for mais de duas vezes mais largo que o mar territorial, a porção central é considerada alto-mar, como o passo de Calais, entre a França e a Inglaterra. As normas adotadas para o mar territorial aplicam-se de igual modo às águas territoriais dos estreitos, mas são exceções significativas as águas, consideradas internacionais, de certos estreitos de largura inferior a seis milhas marítimas e que interessem ao tráfego internacional, seja qual for o número de habitantes da população costeira. Dessa forma, é proibido aos estados ali existentes interditar esses estreitos à navegação comercial, embora tenham o direito de regulamentá-la, sob certas condições.
Mar territorial. Foi na primeira conferência sobre codificação do direito internacional, em Haia (1930), patrocinada pela Liga das Nações, que se consagrou a expressão "mar territorial" para designar a faixa marítima adjacente ao litoral de um estado. Era uma noção antiga, que remontava aos gregos, embora os romanos a tenham contestado, caracterizando o mar como res communis ("coisa comum"), insuscetível de apropriação, atitude que prevaleceu até a Idade Média. No século XVI, o direito internacional assegurou ao estado jurisdição sobre a faixa de mar contígua às suas costas, acrescida do dever de garantir ali a segurança da navegação. Mas nem todos continuaram concordando com isso, nos séculos seguintes.
O inglês John Selden, em Mare clausum (1635; Mar fechado), considerava que até o alto-mar poderia permanecer sob o domínio de um só estado, e que a liberdade de navegação seria resultado da liberalidade do soberano inglês. Para o holandês Hugo Grotius, ao contrário, os mares seriam res extra commercium ("coisa fora do comércio"), que a todos pertenceria. Ainda assim, admitia a jurisdição do estado costeiro sobre as águas adjacentes. Já o também holandês Cornelius van Bynkershoek, em 1703, propôs uma solução militarista e pelo direito da força. O poder do estado teria o alcance da força de suas armas: com isso, a artilharia de costa passou a ser o critério de limite do mar territorial.
Em 1872 o economista italiano Ferdinando Galiani registrou o limite de três milhas, então alcance máximo do tiro de canhão, como base da extensão do mar territorial. Até o fim do século XIX e começo do século XX a regra das três milhas raramente foi contestada, mas a tecnologia aumentou muito o alcance dos canhões e outros interesses corroboraram o abandono dessa orientação. As divergências a respeito levaram ao fracasso a Conferência de Haia em 1930, e em 1958 a I Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar também esteve longe de qualquer consenso: foram defendidas as três, seis, nove, dez e 200 milhas.
Norteada principalmente pela preocupação com a pesca, a Convenção de Genebra sobre o Mar Territorial e a Zona Contígua detalhou todos os aspectos do problema sem resolver a delimitação, cuja nova tendência -- para as 200 milhas -- se firmou a partir de 1970, quando o próprio Brasil, pelo decreto-lei no 1.098, de 25 de março, fixou seu mar territorial em 200 milhas, princípio que se generalizou e em 1976 foi aceito pelos Estados Unidos e pela União Soviética.
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